Qualquer pessoa, mesmo aquele que, por ventura, entendamos que não merece, gosta de ser tratado com urbanidade. Por princípio, respeitamos muito mais quem nos respeita, quem nos trata com educação e quem é amável connosco, do quem nos fala com agressividade, mesmo com educação, ou quem nos fale com má educação.
Se, além de tudo, formos cumpridores das nossas obrigações, quer com os fornecedores quer com os serviços públicos, não gostamos de receber comunicações da nossa máquina fiscal, em que nos fala com tom agressivo e ameaçador.
Dou o meu exemplo:
- No próximo dia 2 de setembro tenho que liquidar o meu IRS de 2014
- Nestes anos todos de contribuinte:
- Nunca deixei de pagar os meus impostos
- Nunca incumpri um prazo de pagamento com o fisco
- Recebi, via email, três comunicações sobre esta obrigação:
- A 14 de Agosto, com o assunto “Decorre até ao dia 31 de agosto….”
- A 26 de Agosto, com o assunto “Alerta pagamento IRS_2014”
- A 31 de Agosto, com o assunto “Alerta pagamento IRS_2014”
A primeira comunicação tem um tom normal, indicando que está a decorrer o prazo de pagamento, mas tem duas falhas fundamentais, não indica a data de pagamento (pressupõe que é 31-Ago e é 2-Set), e informa para ir à opção “> Cobrança / Pagamentos > IRS” (poderia ser um link, mesmo que fosse necessário primeiro autenticarmo-nos), que não consta da navegação de primeiro nível do site das finanças:
As outras duas comunicações são idênticas e absolutamente ameaçadoras. Ameaçam logo com a instauração de processo de execução fiscal, utiliza um português legalista e não uma comunicação normal e foram enviadas pelo “Chefe”, que não sabemos quem é, mas deve ser importante:
Como referi acima, já pago impostos há muitos anos. Sendo cumpridor, estou farto de ser tratado como um devedor, como um criminoso, estando sob suspeita do fisco. Entendo que qualquer cidadão cumpridor deve ter os mesmos sentimentos.
Mudar o sistema é fácil. Bastaria que a rotina que emite alertas não fosse arcaica. Consultaria a situação do contribuinte e veria se este é devedor ou não. Se o sistema fosse um pouquinho mais inteligente, os dados do contribuinte poderiam incluir uma série de alertas comportamentais e classificarem o contribuinte de acordo com o seu histórico. Poderia, por exemplo, para os contribuintes sem dívidas dar-lhes 5 dias de prazo extra, como bónus, recompensando-o pelo seu comportamento. E muito mais se poderá imaginar.
Mas para isso é necessário mudar a cultura, o que é muito mais difícil. É preciso que os funcionários que definam os sistemas tenham essa mentalidade, é necessário que as hierarquias tenham essa mentalidade, mais, é necessário que os POLÍTICOS, que mandam nos serviços, TENHAM ESSA MENTALIDADE.
A questão base é que os serviços públicos ainda tratam os contribuintes como no tempo de Salazar. Ainda há aquela cultura, desculpem a classificação, “fascista” no tratamento dos cidadãos. Ainda há a cultura que a “carneirada” faz o que os serviços públicos manda e mais nada.
Isto não é cultura democrática. Isto é cultura fascista. Isto não é ser tratado como cumpridor e votante, é ser tratado como um bandido, que à partida somos todos, e que, até que provemos o contrário, nunca cumprimos as nossas obrigações, mesmo que o façamos.
Num estado democrático, onde somos inocentes até que se prove que somos culpados, esta forma de tratar os contribuintes pode ser classificada de antidemocrática, de fascista. E porquê? Porque ao contrário do que diz a lei, junto aos serviços públicos, somos culpados até que provemos o contrário.
Isto também se aplica aos fornecedores que são oligopólios. É assim também que as operadoras de telecomunicações nos tratam. Mesmo sendo três e havendo alguma concorrência, no fundo não se distinguem umas das outras quanto ao tratamento dos clientes, somos a mesma “carneirada”.
Para não serem diferentes, também funcionam à base da cunha. Somos “carneirada” até termos uma cunha. Com uma cunha somos “VIP”.
Porque não temos serviços fiscais idênticos aos outros países europeus? Porque andamos sempre a precisar de uma cunha para sermos tratados com dignidade?
Já passaram 41 anos do 25 de Abril!
Basta!
De acordo, Um abraço.