Quer a esquerda quer a direita andam equivocados. Contudo a esquerda mostra sinais muito mais inquietantes de não perceber o mundo. Ainda não notaram que já não vivemos no clássico modelo capitalista explorado pelos capitalistas.
Hoje vivemos numa sociedade onde grande parte da exploração dos trabalhadores foi substituída por máquinas. Existe um “cérebro” central, a internet, de que todos fazemos parte e para o qual todos contribuímos. Hoje existe uma economia digital que é completamente diferente da economia capitalista e onde os economistas, de esquerda e direita, andam às apalpadelas.
Hoje se Marx fosse vivo teria a clarividência de ver que a libertação do homem, do ponto de vista de evolução histórica (que era a sua perspetiva) está mais perto do que nunca de se concretizar.
Contudo a esquerda está completamente perdida. Com a automatização e a ausência cada vez maior de trabalho para o homem (o trabalho é feito pelas máquinas = hardware + software + comunicações), a esquerda fala em perda de empregos, quando deveria estar preocupada em criar estruturas sociais que fizessem a ponte entre o Ontem Capitalista e o Amanhã Digital.
Há uma falta enorme de entendimento pelo que está a acontecer. Poucos percebem que a grande diferença entre economia capitalismo e economia digital, é que a primeira é uma economia baseada na Escassez e a segunda é uma economia baseada na Abundância.
O que faz esta diferença é um pequeno detalhe. Na economia digital o custo marginal é ZERO. Quando se produz algo no digital, fica produzido. Depois é só replicar. O custo de replicar é ZERO.
Quando alguém faz uma música ou um livro e o publica digitalmente, milhões poderão ter acesso sem os constrangimentos de um processo de fabricação capitalista. O custo marginal de imprimir um livro é infinitamente maior (é o que dá dividir por zero) do que a replicação digital, pois consome matérias-primas, instalações, mão-de-obra, armazenamento e distribuição, nem sequer considerando todos os custos de controlo burocrático destas operações eliminadas.
É esta diferença que deixa a esquerda sem chão. Já não há instalações industriais para gravar CDs nem para imprimir livros (músicas e livros só são exemplos de produtos já totalmente digitalizados). Com a progressiva digitalização da economia, por exemplo as impressoras 3D, isto só tende a avançar e cada vez mais rápido. Assim há cada vez menos trabalhadores explorados. A revolução não será mais pela implantação radical do socialismo, mas pela substituição gradual da economia capitalista pela economia digital e em rede, onde as pessoas são donas do seu tempo, aquele que era apropriado pelos capitalistas.
Por outro lado a direita anda a ver como consegue manter a economia capitalista, tentando fazer com que o modelo “gatekeeper” dessa economia perdure, para assim manter o controlo sobre a escassez, apropriando-se dos lucros. É uma tarefa infrutífera. A economia digital e em rede não pára. Só tende a aumentar. E um bom exemplo disto é a Grécia.
Sim a Grécia. Queiramos ou não a Grécia, apesar de estar confrontada com condições dificílimas, está na realidade à frente na revolução da economia em rede, proporcionada pela digitalização do mundo. Face à carência de meios, face a austeridade forçada, a sociedade civil tem vindo a organizar-se em redes de partilha de transportes, de distribuição de alimentos, de partilha de tempo dos componentes da rede para suprir necessidades uns dos outros e aí por diante.
É o que a imaginação lograr. E isto é a auto apropriação do tempo por cada componente da rede, partilhando-o com a rede. É a libertação. Lá se vai a apropriação do tempo pelos capitalistas no processo produtivo.
Trata-se nada mais do que a criação de um modelo alternativo à economia capitalista. Não sei se dura nas formas até hoje encontradas. Nem isso interessa para nada, pois estas sementes haverão de evoluir para modelos mais refinados que atendam as necessidades dos componentes da rede. Tudo isto só é possível graças à digitalização do mundo e, em especial, à revolução de acesso e partilha de informação proporcionado pelas redes sociais, habilitado primeiro pelos computadores pessoais, mas radicalizado pelos telemóveis.
Assim a esquerda, que quer a revolução pela eliminação do capitalismo, substituindo-o pelo socialismo, trilha um caminho completamente desfasado da realidade. Está no meio da revolução e não entende. Não entende, porque sempre concebeu a troca do capitalismo pelo socialismo como uma mudança radical (ler Lenine para mais informação).
Por isso quando vemos as propostas do PS (bem, aqui há tanta indecisão que não percebemos bem quais são, mas pelo menos há os princípios), do PCP e do Bloco de Esquerda, vemos que não percebem o mundo e que fazem propostas que não têm aderência nenhuma à realidade.
Por outro lado temos a coligação PSD/CDS, que também não entende o que se está a passar. No entanto tem uma grande vantagem sobre a esquerda. Essa vantagem é ideológica. Não há ideologia, mesmo que os chamem de neoliberais. São muito mais pragmáticos. Têm um instinto de sobrevivência muito maior. Não percebem o que se passa e não têm soluções de longo prazo, mas são flexíveis e vão-se adaptando com realismo às mudanças. E isto faz uma diferença fundamental aos olhos dos cidadãos, que se apercebem que dali vem realismo e que entendem as consequências que terão nas suas vidas, independente de serem boas ou más.
Esta reflexão leva-me à conclusão que a probabilidade do PSD/CDS ganhar as eleições é realmente muito maior. As pessoas querem ter algumas certezas no futuro, para poderem lidar com a vida (sei com que linhas me coso).
Independentemente de serem boas ou más, o baixo nível de incerteza ajuda a tomar as decisões mais adequadas a cada momento de vida. E isto é demasiado importante para cada família para optarem pela incerteza, mesmo que seja contra a austeridade.
Voltando à Grécia, o seu exemplo ajuda a tomar a decisão. O Syriza, na tentativa de obter menos austeridade, o que gerou, na realidade, foi MAIS AUSTERIDADE.